Um pôr-do-sol dourado estava se tornando roxo escuro. Ela sentiu frio nos ossos. Estavam acampando para passar a noite. Olhou ao seu redor para o terreno que serviria como local de acampamento. A grama crescia, alta e densa, onde corria um riacho.
Um cavalo já estava começando a pastar enquanto o seu cavaleiro lhe tirava a sela.
O murmúrio da água atraía Hermione como um poderoso ímã. A sede lhe queimava a garganta e a língua. Fitou o local de onde vinha o som, os pés grudados ao terreno áspero.
Colocaram-lhe um cantil sob o nariz. Ao sentir o cheiro úmido da água, suas mãos amarradas estenderam-se avidamente para ele, até que seus olhos reconheceram a mão enluvada que segurava o cantil.
O olhar subiu pelo braço envolto no poncho até o rosto sedutor do seu seqüestrador.
O corpo ressequido tremia de desejo de beber, mas não pôde forçar-se a aceitar a água daquele cantil. Baixando as mãos, Hermione enfrentou desafiadoramente o seu olhar velado, sabendo que seria ela própria a sofrer com essa demonstração de rebelião auto-destrutiva, mas sem se importar.
Uma sobrancelha se ergueu, dando-lhe um segundo para pensar no assunto antes que o cantil fosse retirado. Quase enlouquecida de sede, ela girou e deu de cara com o olhar pensativo do americano.
Deu um passo trêmulo para o lado, para afastar-se de todos eles, mas parou ao ouvir uma ordem em espanhol, dada pela voz que começava a reconhecer.
- Estou cansada demais para fugir. Só o que quero fazer é me sentar. - A voz estava rouca e áspera, mal a reconhecia. - Dá para você entender?
Evidentemente, o seu recado foi entendido, ou pela interpretação da debilidade da voz, ou pela instabilidade das pernas. Ninguém tentou detê-la quando recomeçou a andar, os músculos cansados oferecendo pouca coordenação.
Um tufo de grama verde serviu de almofada para Hermione. Largou-se sobre ele, agradecida, sem vontade de se mover ou pensar. Mas precisava concentrar-se noutra coisa que não fosse a sede. Tentou fitar o céu que escurecia para achar a primeira estrela da noite. Seus olhos perscrutadores depararam com um homem agachado ao seu lado, segurando um cantil nas mãos. Inspirou vivamente diante daquela visão atormentadora, com o olhar acusador voando para os olhos verdes.
- Vá embora - falou Hermione, com voz rouca.
- Pensei que era uma sobrevivente, Sra. Hermione Granger Weasley - zombou ele -, mas cá está você, tentando morrer de sede. Sempre teve estas tendências suicidas.
- Não é da sua conta - disse. Fechando os olhos para evitar ver o cantil, enterrou o rosto na grama.
- É da minha conta, sim. É da conta de todos nós - ressaltou ele. - Você alega ter um pai rico que nos pagará uma nota preta para a devolvermos para ele. E cá está, tentando matar-se antes que possamos fazer-lhe esse favor.
- Dinheiro.
Hermione tentou rir, mas só conseguiu emitir um som abafado.
- Lá na estrada você usou bons argumentos para que a mantivéssemos viva. Não entrou em pânico, não perdeu a cabeça. Então, por que não banca a esperta agora e toma um gole d'água! - Desatarraxou a tampa do cantil, e ela chegou a tremer ao escutar o barulho. - Não tem nenhuma vontade de morrer, Sra. Weasley.
Hermione crispou-se.
- Não me chame deste jeito.
O que ela estava realmente pensando é que não queria morrer.
Uma mão curvou-se sob o seu queixo, erguendo-lhe a cabeça. O frescor da abertura de metal do cantil tocou-lhe os lábios. O cheiro doce da água atordoou seus sentidos.
- Vamos. Beba.
Ele inclinou o cantil, fazendo que um filete de água escoasse pelos lábios dela.
Hermione ergueu a mão para inclinar mais o cantil e deixar mais um pouco da água refrescante encher a sua boca seca. Não conseguia engolir com rapidez suficiente, e começou a se engasgar.
- Vá com calma - advertiu o americano, e prendeu o cantil. - Beba devagar... um pouquinho de cada vez.
Hermione forçou-se a tomar pequenos goles, quando tinha vontade de engolir tudo de uma só vez.
Ainda havia água no cantil, quando ele o tirou. A moça podia ter tomado toda a água, e ainda mais, e lhe disse isso.
- Mais tarde - tranqüilizou-a, depois fê-la deitar-se na grama.
Ela ajeitou a cabeça no seu travesseiro de grama e pôde olhar mais facilmente para ele. Examinou-o, calada por um minuto, ainda envolta no casulo confortável que a protegia temporariamente da realidade da sua situação.
- Como se chama? - quis saber Hermione.
A hesitação dele foi evidente, enquanto fingia estar concentrado arrolhando com firmeza o cantil.
Quando acabou, olhou com indiferença aparente para o resto do bando. Havia frieza no olhar verde que voltou para Hermione.
- Meu nome é Harry Potter, mas me chamam apenas de Potter - falou, indicando com um gesto de cabeça os outros membros do grupo. Hermione esperou que ele lhe confiasse seu nome completo. A boca do rapaz se estreitou, sombriamente.
Um brilho felino de curiosidade apareceu nos olhos dela.
- Você é de Laredo! Seu sotaque não me engana.
- Não exatamente - falou, e ficou calado.
- É americano! - insistiu Hermione.
- Nasci lá.
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N/A: Mais um capitulo postado! =D Deixem reviews pessoal...