Culpa...
Era realmente ridículo que estivesse ali. Incrivelmente ridículo. Ele não podia fazer nada além de se odiar. E sofrer. Sua total culpa. Nunca uma culpa fora tão focada em uma pessoa só. Destroços, pedras, pó. O lugar estava quase tão destruído quanto ele. Com as mãos trêmulas e desesperadas ele começou a abrir espaço para chegar até a escada. Tinha tanto medo de subir as escadas! Mas mesmo assim uma ânsia o impelia desesperado, enquanto ele tropeçava nas próprias pernas. Finalmente chegou até o segundo andar. A primeira coisa que viu foi uma porta idiota. Letras azuis diziam “Harry” e vassourinhas a enfeitavam. Empurrou-a apressado e parou de chofre. No chão, coberta de poeira, num mero amontoado de cabelos ruivos e pele alva, jazia ela. Ele achou que não conseguiria dar mas nenhum passo. Encostou-se ao batente da porta e respirou fundo. Fraco, trêmulo. E sobretudo culpado. Deu-se conta de que um irritante som preenchia o ambiente e seus olhos foram atraídos para o berço no canto do quarto. Um bebê chorava estridentemente agarrado às grades e às vezes estendia as mãozinhas para o corpo no chão, chamando-o enquanto balbuciava. Ele aproximou-se ignorando o bebê. Ela estava com as costa na parede, o corpo inclinado para a lateral. As mãos fechadas como que esperando sentir dor. Ele olhou para o rosto dela. Ela ainda tinha os olhos abertos. Os lindos olhos brilhantes agora ressecados e empoeirados.
– Oh, Lily – ele se atirou contra ela abraçando-a. Olhou uma última vez para os olhos dela. – Me perdoe... – ele fechou os olhos dela sentindo imediatamente falta do verde. A falta doeu imensamente. O corpo dela era frio. Os lábios contorcidos em uma expressão apavorada. A culpa o atingiu como uma bofetada. Sentiu falta do sorriso cínico dela. De como ela gargalhava...
Em segundos seu choro se misturava ao da criança. Será que choravam pela mesma dor?
Ele tocou com seus lábios, os lábios ressecados e gélidos dela. E ficou alguns minutos embalando-a. Por que ela não poderia simplesmente acordar?
Deitou-a com cuidado no chão. Tinha que ir. Em breve chegariam outros. Viriam pelo menino. O menino...
Olhou para a criança com o rosto vermelho de tanto chorar...Os olhos dela. O rosto dele. Respirou fundo e virou as costas. O choro da criança se intensificou. Ele virou e o viu com os bracinhos esticados em sua direção. Seus olhos encontraram o verde dos dele. O verde dela. Algo dentro dele foi preenchido. Irritado ele esticou os braços e o pegou. O bebê aninhou-se no seu peito soluçando fraquinho. Ele o embalou por alguns segundos. Depois devolveu-lhe ao berço. Os olhos dela...O rosto dele. Respirou fundo e virou-se.
– É a última vez que toco em você, Potter. – disse enquanto saia pela porta.
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